sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

CARTA DE CRÉDITO - I

A Carta de Crédito como Instrumento de Pagamento

O Crédito Documentário é um dos mais perfeitos e eficazes instrumentos de pagamento utilizados no comércio internacional. Sendo irrevogável, constitui-se em compromisso firme do Banco Emitente. Se confirmado, tem, adicionalmente ao do Banco Emitente, o compromisso firme do Banco Confirmador. Se emitido e/ou confirmado por um first class bank, em país que não ofereça risco de transferência, o Beneficiário poderá estar certo de que o seu negócio comercial chegará a bom termo. Basta, para isso, que ele cumpra todos os termos e condições do Crédito e apresente, em ordem, todos os documentos nele exigidos!

1. Definição, Tipos e Utilização de Cartas de Crédito

1.1. Definição

Originária da “família Carta de Crédito”, o Crédito Documentá­rio ou, como é mais conhecido pelos operadores, Carta de Crédito, nada mais é que um compromisso bancário de pagamento condicionado. Um Crédito, como aqui será designado, significa, em última análise, que um banco, por conta e ordem de um Tomador (em regra, o comprador), assume o compromisso de pagar certa quantia, à vista ou a prazo, ao Beneficiário (normalmente, o vendedor), desde que este comprove, documentalmente, ter cumprido todos os termos e condições indicados no referido instrumen­to. Trata-se, pois, de instrumento de pagamento.

O Crédito está regulamentado pela Publicação 600 – Regras e Usos Uniformes para Créditos Documentários, da CCI, Paris, Revisão 2007, em vigor a partir de 1º de julho de 2007 (UCP 600 – ICC Uniform Customs and Practice for Documentary Credits, 2007 Revision, in force as of July 1, 2007). Para que tais regras possam produzir os seus efeitos nas operações é indispensável que sejam incorporadas, sempre, ao texto do Crédito, conforme estabelece o seu art. 1º.

1.2. Razões para Utilizar o Crédito

Como será observado no decorrer deste trabalho, o Crédito é modalidade que traz no seu bojo algumas características negativas para todos os participantes da operação. É operação complexa, posto que, desde a sua emissão até a sua liquidação, as partes têm de se pautar pela exatidão das informações e pelo cumprimento de regras rígidas, sob pena de por em risco toda a segurança desejada. Notabiliza-se pelas despesas cobradas pelos bancos, que, além das tarifas de serviços, cobram pesadas comissões. Destaca-se, também, pela morosidade na sua operacionalização. Envolvendo riscos e termos ou condições especí­ficos, muitas vezes de difícil cumprimento, nem sempre as partes obtêm a agilidade exigida pelo comércio internacional. Finalmente, cabe lem­brar que seu pagamento é efetuado contra documentos. Isto significa que, se o Beneficiário cumprir todas as exigências, mas, por alguma razão, apresentar um documento divergente, discrepante, o pagamento deixa de ser efetuado. Visto de outro lado, se os documentos forem apresentados em ordem, o pagamento será efetuado, ainda que os bens não estejam de acordo.

Portanto, é de se supor que as partes devam ter fortes razões para utilizar o Crédito. Acredita-se que seja a única ou a última solução dispo­nível para a concretização daquele negócio.

Pode ser que o comprador ainda não tenha obtido uma linha de crédito junto ao fornecedor com o qual está iniciando relações comer­ciais, ou ele esteja realizando uma compra além do limite de crédito já existente.

É possível que o vendedor, ainda que confie no comprador, não queira ser surpreendido com o risco de transferência, ou seja, com o risco político. Neste caso, a dúvida não é sobre a qualidade do comprador e sim sobre seu país.

Ou, ainda, pretenda o vendedor – particularmente em operações a prazo – viabilizar um financiamento, um desconto após o embarque. Certamente, se a operação estiver amparada em um Crédito, isto poderá ocorrer com maior facilidade e menor custo.

Verifica-se, pois, que muitos são os motivos que podem fazer com que as partes se utilizem do Crédito como meio para realizarem suas operações comerciais.

2. Tipos de Crédito

Os Créditos podem ser classificados considerando-se o tipo de compromisso assumido pelo(s) banco(s), se irrevogáveis não confirmados ou irrevogáveis confirmados. Podem ser classificados, também, levando-se em conta se são liquidáveis, ou disponíveis, por pagamento, por pagamento diferido, por aceite ou por negociação e, ainda, se são disponíveis junto a um determinado banco, portanto, restritos, ou se são livremente negociá­veis, ou seja, disponíveis junto ao qualquer banco.

2.1. Quanto à Liquidação ou Utilização

No Crédito, esta condição é identificada pela expressão available by (disponível por) e se refere à sua liquidação ou à sua condição de pagamento.

2.1.1. Por Pagamento (available by payment)

É o mesmo que sight payment ou at sight. Significa que o Crédito é disponível por pagamento à vista. Será pago, portanto, contra a apresen­tação dos documentos em ordem.

2.1.2. Por Pagamento Diferido (available by deferred payment)

Trata-se de crédito com pagamento a prazo, sem emissão de saque. É utilizado, principalmente, nos países onde a tributação alcança a emissão de saques a prazo. O prazo para pagamento é estabelecido a contar de um dos eventos da operação, geralmente, do embarque.

2.1.3. Por Aceite (available by acceptance)

Crédito disponível por aceite de saque, a prazo. Emitido pelo Beneficiário, contra o Banco Emitente ou outro Sacado indicado no Crédi­to, o saque será aceito para pagamento no seu vencimento. Freqüentemen­te, é descontado pelo banco, no ato da apresentação.

2.1.4. Por Negociação (available by negotiation)

Crédito disponível por negociação significa que o seu pagamento será efetuado pelo Banco Negociador, a quem o saque ou os documentos são apresentados. O pagamento, em regra, é efetuado sem direito de regresso contra os sacadores e/ou portadores de boa-fé (bona fide holders). É importante observar que a análise dos documentos e sua remessa para o exterior não caracterizam, em si, uma negociação.

2.2. Quanto à Disponibilidade

No Crédito, esta condição é identificada pela expressão available with (disponível por) e indica o banco ao qual os documentos deverão ser apresentados para pagamento, aceite ou negociação. Nas mensagens tele­processadas pelo SWIFT aparecem com a condição de liquidação available by/with (disponível por/com).

2.2.1. Restrito (restrict)

Aquele que indica o Banco Designado (nominated bank), ou seja, o banco ao qual os documentos deverão ser apresentados. Destaque-se que o compromisso firme dos Créditos irrevogáveis e irrevogáveis confirmados vinculam o Beneficiário ao cumprimento desta condição (available with Banco ....). Um crédito disponível com um certo banco designado também é disponível com o próprio banco emitente


2.2.2. Livremente Disponível(freely available)

Ao contrário do restrito, este Crédito não designa nenhum banco como sendo aquele a quem os documentos deverão ser entregues. Indicam a condição freely available ou available with any bank, significando que o Beneficiário poderá apresentar os documentos a qualquer banco e em qualquer parte do mundo. Eventualmente, pode fazer a indicação do país de apresentação, como por exemplo, freely available in Brazil ou availa­ble with any bank in USA.

2.2.3. Crédito Direto (straight credit)

É o Crédito que tem como Banco Designado o próprio Banco Emitente. Nenhum outro banco está autorizado a pagar, aceitar ou a nego­ciar referido Crédito. As obrigações do Banco Emitente de um Crédito direto se estendem, somente e diretamente, ao Beneficiário.

Nestes casos, o local e data de vencimento farão referência, sempre, ao país de emissão. Certamente, para essa finalidade o Crédito indicará a seguinte cláusula documents must be presented at our counters on or before … (os documentos deverão ser apresentados em nossos balcões em ou até …), ou outras de efeito semelhante.

Apenas para que não sejam incluídos e nem confundidos com a classificação objeto deste capítulo, registre-se aqui a existência dos chama­dos Créditos Especiais, tais como o transferable, revolving, back-to-back e standby, bem como dos Créditos com Cláusulas Especiais, como é o caso da red clause e da green (ink) clause. Estes Créditos e cláusulas especiais serão tratados em capítulo próprio.

DOCUMENTOS EXTRAVIADOS


O artigo 35 da UCP 600 responsabiliza o banco emissor e o confirmador por honrar, negociar ou reembolsar o banco designado no caso de extravio de documentos. Na qualidade de banco emissor e para nossa proteção, emitimos nossos créditos estabelecendo que "Nos casos em que houver extravio dos documentos, o pagamento somente será efetuado após a apresentação de um novo jogo de documentos". Alguns bancos designados têm recusado essa cláusula. A nosso ver, quem poderia questionar é o exportador.Ao dispor que o banco emissor ou o banco confirmador deverá honrar um crédito, mesmo que os documentos tenham sido extraviados, e sempre considerando as situações em que o banco designado tenha determinado que a apresentação está em conformidade, a UCP600 tem provocado sérias discussões.
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Se o banco designado determinar que uma apresentação está conforme e encaminhar os documentos ao banco emissor ou ao banco confirmador, independentemente de o banco designado tê-la honrado ou negociado, ou não o banco emissor ou o banco confirmador deverá honrá-la ou negociá-la ou reembolsar o banco designado, mesmo quando os documentos tiverem se extraviado em trânsito entre o banco designado e o banco emissor ou o banco confirmador, ou entre o banco confirmador e o banco emissor.
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Ora, honrar ou negociar sem ter a documentação é uma situação bastante delicada tanto para o banco emissor como para o confirmador. Porém, é preciso considerar a questão sob a ótica do banco designado e do banco confirmador, em especial para o que dispõe o art. 15 em suas alíneas "b" e "c". Sendo banco confirmador terá que honrar ou negociar para depois remeter os documentos, porquanto deve ser contemplado com o reembolso por parte do emissor do crédito. Como designado que honrou ou negociou, também deve ser reembolsado. O art. 35 determina que o pagamento seja feito ao designado ainda que ele não tenha pago ou negociado. Basta que ele determine que os documentos estavam em ordem.

Diante disso, sugerimos as seguintes alternativas:

1. Estabelecer o crédito disponível apenas com o próprio banco emitente. Assim, não sendo recebidos os documentos pelo emissor, não se configura a apresentação. Todavia, se o crédito for confirmado, o confirmador desejará de ser o "designado". Muitos beneficiários também têm exigido créditos disponíveis em seu país ou "livremente negociáveis";
2. Outra opção é ressuscitar a prática da "segunda mala". Uma primeira mala contendo a maior parte dos documentos originais e algumas cópias, e uma segunda mala contendo o resto dos documentos. Esta segunda mala será enviada pelo menos três dias após a primeira.

Ademais, lembrar, as regras da UCP são aplicáveis, salvo se em contrário estabelecido. Ou seja, em caso de conflito entre o crédito e a UCP, prevalece o disposto no crédito!
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